Notícias de Ourém, Julho 2005
Aqui há bastantes anos, tantos que nem eu me lembro bem, era costume os homens trabalharem à jorna, enquanto as mulheres ficavam em casa para lhes fazerem o almoço. Quando chegava lá a certa hora e tudo estava pronto, a mulher metia o almoço na cesta para a ir levar ao marido.
Com o passar do tempo, algum filho mais velho começava também a trabalhar, e tudo ficava um pouco mais complicado. Se a jorna dele não fosse perto do pai, a mãe tinha de organizar a volta e sair mais cedo, para poder chegar a todos, sem prejuízo de ninguém. O que ainda podia salvar a situação era haver alguma irmã mais nova que desse uma ajuda na volta. Cada uma seguia por seu lado e todos ficavam servidos.
Nem quero pensar o que seria se os filhos fossem cinco ou seis e não trabalhassem todos juntos. Bem se podiam arranjar ajudantes para levar o almoço a toda a gente, um para norte, outro para sul, uns para poente, outros para nascente.
Vêm estas a ideias a propósito de uma novidade que eu ouvi há pouco tempo. Como vinha de gente séria, tenho todas as razões para acreditar que as coisas são mesmo assim.
Disseram-me que está para ser construída entre Ourém e Caxarias, na zona industrial, uma cozinha central da Câmara Municipal, para preparar almoços para várias instituições. A ideia, em si, parece ter algumas boas intenções. Uma cozinha central normalmente fica mais económica e é mais fácil de controlar, do ponto de vista da higiene e da qualidade. Mas aqui é que voltamos à nossa história das jornas, com os almoços a serem levados a quem anda a trabalhar. É que, por mais estranho que pareça, esta cantina estava pensada para servir refeições às escolas do Concelho. Assim por alto, para se fazer uma ideia, podemos dizer que são à volta de cem.
Na primeira parte do plano, não parece complicado produzir as refeições para toda essa gente, o problema é levá-la até ao lugar onde vai ser comida. Se a cozinha vai ficar situada entre Ourém e Caxarias, é num ponto bem central, o que tem importantes vantagens para organizar a volta. Mas o que eu ainda não compreendi é como se vai orientar a distribuição de almoços por tanta gente. Então vão pôr carrinhas diariamente na estrada, a caminho da Giesteira de Fátima, das Matas e do Cercal, de S. Jorge da Freixianda, de Alburitel e de Seiça? Quantos quilómetros se hão-de fazer por dia para chegar a cem escolas? Quanto tempo demoram as viagens? A comida aguenta a qualidade no meio de tanto abanar? Quantos trajectos são precisos, para norte e para sul, para nascente e poente? Quanto se poupa afinal com uma solução como esta? E quanto se gasta a mais?
Acredito que aqui há muito boas intenções, há um plano, mas só pensado até meio, falta-lhe a parte final.
Se as mulheres de antigamente aqui pudessem falar, lembradas de quando tinham de fazer uma grande volta para levar o almoço aos homens que andavam longe a trabalhar, elas haviam de ter uma opinião sobre esta maneira de organizar.
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