segunda-feira, 16 de julho de 2007

Já Falta Pouco

Notícias de Ourém, Agosto 2005

Conhecem a história “O rei vai nu”? O caso de que quero falar hoje tem tudo a ver com essa história.
Na entrada de Ourém, vindo de Fátima, onde deveria ficar o Internarché, lá está a promessa que parece sem ter fim: “já falta pouco”. Parece um novelo que não dá para desatar. Autorização, desautorização, obras, paragem, interesse público, interesse privado, mudar o PDM, suspender o PDM, fazer um Plano novo. Já nem sei quantas foram as soluções que a Câmara tentou para emendar o que autorizou, segundo consta, fora da lei. Mas agora diz-se no jornal que há outra solução, engenhosa e definitiva, que vai resolver tudo em pouco tempo. A Câmara vai pedir uma rectificação nos mapas do PDM, porque se enganaram a fazer o desenho. O sítio do novo Intermarché devia estar marcado como sendo zona urbana e não como reserva. Que genial, não sei como só agora é que repararam!
É aqui que entra a tal história do rei que vai nu. Passou-se há muito tempo com um rei que gostava de se vestir muito bem. Se nos formos a guiar pela Bíblia, parece que o rei mais bem vestido era Salomão. Mas como o rei Salomão era um tipo bastante inteligente e esta história é um bocado tonta, o mais certo é ser outro o rei deste conto. Se calhar era o pai dele, o rei David.
O tal rei da nossa história estava a engordar e já nenhum fato lhe servia. Por isso, ele chamava todos os meses os alfaiates para lhe fazerem um fato novo. Por azar, cada novo fato durava pouco tempo, porque o rei continuava a engordar. Até que chegaram ao reino uns mercadores muito espertos, que souberam do caso, e apresentaram-se diante do rei para lhe propor uma solução. Eles iam fazer um fato que se adaptava perfeitamente ao problema do rei, porque esticava e encolhia conforme a necessidade. O rei ficou encantado e deu ordens para que nada faltasse a tão inteligentes inventores.
Assim, durante meses os mercadores comeram e beberam, à conta do orçamento, do bom e do melhor. E iam pedindo tecidos e ouro para fazer a sua obra. Mas sempre que o rei queria ver o andamento dos trabalhos, eles arranjavam mil desculpas e diziam que só depois de pronto é que se podia ver o real valor do que eles estavam a preparar. Depois de muito consumir, e de viver muito bem à custa do rei, deram a obra por pronta e trouxeram-na para o rei a experimentar. Mas, como não tinham feito coisa nenhuma, convenceram o rei de que era uma peça de roupa tão delicada que os olhos dos tontos não a iam conseguir ver. O rei não via absolutamente nada, mas com receio de que o tomassem por tonto, disse logo que era uma veste magnífica e mandou pagar principescamente aos mercadores. E todos no reino, para não serem chamados tontos, fingiam que viam a roupa que não existia.
Quando o rei apareceu em público, a notícia já se tinha espalhado e ninguém queria ser considerado tonto, por isso todos aplaudiam. Até que um rapaz começou a gritar “o rei vai nu!”, e todos perderam a vergonha de dizer a verdade, que todos viam e que ninguém queria aceitar. Todos gritaram então: “o rei vai nu”! Fim da história, o rei fugiu com vergonha.
Nos nossos dias já não temos rei na nossa terra. Temos é um Presidente da Câmara, que por acaso também se chama David. Não são os mercadores que andam a consumir o orçamento para fazer uma roupa para o rei, mas temos as empresas de consultores que fazem estudos para a Câmara e dão conselhos a preços incríveis, para depois termos o mesmo resultado, que “o rei vai nu”. Isto é, passam meses a viver do orçamento e chega-se ao fim e apresentam qualquer coisa que não tem sentido nenhum, mas é paga a peso de ouro.
A mim parece-me que é agora o caso, com esta nova proposta de pedir para emendar os mapas, porque se enganaram a pintá-los. Mas será que, honestamente, alguém na Câmara acredita que vai resolver o problema do Intermarché pedindo para emendar um mapa, porque se enganaram a pintar a cor de um bocadinho de terreno? Assobiamos todos para o ar e fingimos que a gralha tipográfica passou despercebida a todos os técnicos que durante anos fizeram os estudos? Que passou despercebida a todos os políticos que estudaram o projecto antes de o aprovarem? Que passou despercebida aos outros técnicos que usaram esse mapa para emitir a licença de construção que depois retiraram? Alguém, honestamente, acredita que ao fim de anos e de rios de tinta, de intervenções do tribunal, de debates de políticos e especialistas, que afinal a questão se resume a pedir licença para mudar a cor daquele bocadinho de terreno, no mapa oficial do PDM? E será que isso também se aplica noutros casos? É que pode haver mais algum particular que tenha um terreno marcado, por engano, com a cor errada!
Desculpem lá, mas por mim, prefiro que todos me achem tonto, como na história do rei, para poder dizer que “o rei vai nu” e que, honestamente, acredito que é uma parvoice o que os especialistas descobriram com mais esta invenção.
Afinal quanto tempo mais vamos assistir a esta brincadeira? Só espero que seja verdade o que lá está escrito, na saída de Ourém em direcção a Fátima: “já falta pouco”.

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